terça-feira, 10 de maio de 2011

Reentrâncias


Todas as tardes ele trazia consigo um punhado de farelos e os jogava descompromissadamente naquela velha praça e todas as tardes as mesmas crianças perguntavam? “Quanto tempo tem você?”

Ele sequer sabia, sabia que tinha muito que passara, mas nada lhe constava sobre o quanto ainda restava, passava dias assim olhando pela vereda do destino o que as pessoas deixavam no meio do caminho.

A moça que perdia o olhar quando o homem apressado com a pasta marrom que ia em sua direção, mas apenas passava, ele deixava no ar um cheiro de tinta de escritório, ela de memórias mal guardadas, mofo e solidão, mas todas as tardes ia de encontro a ele, nos poucos segundos em que conseguiu mirar seu rosto ela pensava “Ele vai ser perder ainda, vai deixar a pasta cair então...”

Então o velho pensava... ”Mais tempo que se foi todo o tempo...”.

A senhora que usava um vestido arroxeado ligava apressadamente para a babá, lembrando para não esquecer a hora dos remédios do filho, esse filho que ela tinha tentando abortar e por isso nascera coma autismo, pensava... ”Será que ainda me espera?” O amante.

Era o tempo todo de girassóis, mas girassóis não possuem perfume e, no entanto a praça era perfumada por algo que lhes trazia a memória uma década atrás, onde os mais moços deitavam seus litros de bebidas e cantavam coisas constantes.

A tosse dele piorava... Tempo, tempo, tempo. Quanto tempo?

Em questão de segundos (caso se possa contar o tempo) Um ônibus freou bruscamente, a moça com cheiro de mofo estava estatelada no chão, onde a multidão fazia fila para visar o acontecimento. No mesmo instante a dona do vestido arroxeado chegava ao quarto de motel...

_ Você não fica bem de roxo!

_ E essa sua pasta está velha demais...

Tempo velho demais.